22.2.11

Aqui e agora


Vivemos tempos cinzentos. Por muito que o Governo anuncie e por mais que Oposição nos prometa. Chamando as coisas pelos nomes, a volta de que o país precisa não depende do entusiasmo que Sócrates saiba imprimir nas boas notícias, nem, sublinhe-se, da condolência que Passos Coelho possa depositar nas notícias más. É louvável o esforço de ambos. Mas não chega.

Sabedor de que o país precisa de ânimo para ultrapassar a crise – ou de que isso é, afinal, tudo o que nos resta – o primeiro-ministro anuncia, todos os dias, um novo dia. O líder do PSD, por seu turno, vai mantendo um ar grave, ao mesmo tempo que deixa entrever, numa quase lágrima, as ideias salvíficas com que, a bem da Nação, nos há-de ungir, a nós, pobres portugueses. Ambos se esquecem do essencial: se existem vários caminhos para redimir o país, a política, tal como a conhecemos hoje, não será um deles.

De toda a parte – e de todas as partes do Mundo – nos chegam ecos de descontentamento, ao mesmo tempo que nos sopram ventos de mudança. A política, o tipo de política que conhecemos, tem os dias contados. E a urgência de um tempo novo está longe de ecoar apenas no peito daqueles a que habitualmente chamámos profetas da desgraça. A desgraça – sob a forma de opressão ou de violência; bem como sob a veste do desemprego, da precariedade e do abandono – há muito que se abateu sobre nós e já não precisa, está visto, de maiores profecias. Não é tempo de exorcizar o passado, nem é tempo de efabular sobre o futuro. O tempo, o nosso tempo, é aqui e agora.

Aqui e agora, uma nova forma de fazer política há-de surgir e, para essa mudança, é tanto ou mais importante o que se faça à escala nacional como o contributo que cada cidadão e as comunidades locais forem capazes de dar. Para começo de conversa, gostaria que, ao invés de discutirmos a redução do número de deputados, discutíssemos quais os candidatos que se hão-de apresentar ao país. Em Coimbra, interessa-me mais saber quais serão os escolhidos do que quantos serão os eleitos.

Verdadeiramente, as próximas listas de deputados pelo círculo de Coimbra serão uma oportunidade única para – sobretudo os dois maiores partidos – fazerem a sua prova de vida. As lideranças frescas que ambos apresentam – Mário Ruivo por um lado e Marcelo Nuno por outro – não resistirão a um novo ciclo de escolhas erradas, como aquelas que ao longo dos anos têm apoucado – e de que maneira – a cidade de Coimbra.

15.2.11

Tempos de mudança


João Gabriel Silva é o novo Reitor da Universidade de Coimbra e a sua eleição – arrisco dizer – ocorre ao arrepio de muitas expectativas geradas na Universidade e na cidade, ao longo dos últimos anos.

Com efeito, a eleição foi disputada com a professora da Faculdade de Letras, Cristina Robalo Cordeiro, desde sempre integrada em lugares cimeiros da equipa do reitor cessante, Fernando Seabra Santos. E para os que – mesmo distraidamente, como eu – observaram o desenrolar do processo, não é novidade dizer que a eleição daquela que seria a primeira mulher reitora da Universidade de Coimbra era dada como certa, prometida, quase escrita nas estrelas, desde há muito. Não aconteceu.

Poderá dizer-se que o novo método de eleição dos Reitores, de acordo com o actual Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, desequilibrou, num dado momento, as variáveis em presença. Mas isso, sobretudo para quem não conhece o tema de um modo rigoroso, como é o meu caso, será sempre do domínio da especulação. A mim, confesso, não me interessa especialmente seguir esse caminho. É outra a minha motivação.

Gosto, simplesmente gosto, quando em democracia as coisas não acontecem conforme foram escritas nas estrelas. E isso, neste particular, devo assegurar que não tem qualquer relação com a opinião que deixo ou deixo de ter acerca dos candidatos, vencedor e vencido, em presença.

O que me agrada é a renovada sensação de que, quando menos se espera, a política – e a reitoria é política! – vem devolvida ao arbítrio dos que votam, não podendo programar-se, com grande antecedência, pelos outros, pelos que são votados.

Este é o tipo de circunstância que remete para dois tipos de reflexão. Por um lado, a de que em democracia, como na vida, ninguém está gloriosamente talhado para o sucesso, ao mesmo tempo que ninguém deve considerar-se fatalmente condenado ao fracasso. Por outro, a ideia de que não é em nome próprio, mas em nome de quem no-lo confia, que o poder deve ser exercido.

Com a devida vénia – e sobretudo nos tempos que correm – saiba o novo reitor manter isto presente e estará já a prestar um grande serviço. À Universidade, à Academia, a Coimbra e ao País.

8.2.11

Em nome dos cidadãos


Não tenho da vida uma visão maniqueísta. Talvez por isso, tento manter alguma abertura a diferentes perspectivas das coisas, ainda que vindas de quem não torça pelo mesmo clube, não professe a mesma religião, não vote no mesmo partido. E, deste logo, porque não é do meu feitio (feitio que, adianto, nem é grande coisa) perder tempo a tentar decifrar reservas mentais. Não se trata de especial benevolência, nem de uma particular ingenuidade. É mais, se quiserem, uma razão de ordem prática. Não se vai a lado nenhum quando se é incapaz de estabelecer pontes com os outros. E procurar uma motivação cabeluda no espírito de cada não é, para tal, um grande começo.

Vem isto a propósito do dossier Metro Mondego e dos seus desenvolvimentos recentes. Para todos os efeitos, o ponto em que estamos hoje é significativamente mais auspicioso do que aquele em que estávamos há uns tempos atrás. Graças ao Governo? Graças ao PS Coimbra? Graças ao Movimento de Cidadãos? Graças aos Autarcas? Graças a todos eles, digo eu.

Maniqueísta seria dizer que nunca houve problema nenhum, que o Governo sempre esteve comprometido com o Metro e que as suspeitas de abandono, lançadas na praça pública, não tiveram qualquer fundamento. Maniqueísta seria dizer, por outro lado, que o Metro esteve morto, enterrado e apenas devolvido à vida pela acção de um Movimento de Cidadãos.

Com efeito, momentos houve em que a guerra pareceu definitivamente perdida, face a um Governo que, a espaços, assumiu sobre o assunto posições desconexas e autistas. Mas também é verdade que, ao contrário do que alguns quiseram fazer crer, o Governo não chegou a sentenciar de morte o sistema de mobilidade essencial às populações que o projecto Metro Mondego pressupõe. E, no meio disso tudo, faça-se a justiça de reconhecer que foi um certo esforço de concertação – partilhado entre todos os intervenientes – que permitiu trazer à tona as garantias mais recentes sobre o projecto. Garantias que atendem às especiais dificuldades que o país atravessa, sem deixarem de atender ao compromisso assumido com as populações.

É por isso que – e permitam-me o desabafo – não percebo uma certa ansiedade de manifestação sobre o assunto, ainda há dias patente na inauguração do novo Pediátrico de Coimbra. Com franqueza, faço votos para que o maniqueísmo não estrague o que a sensatez e a convergência de esforços foram capazes de construir. Em nome dos cidadãos, claro.

1.2.11

Um ponto de Ordem


Não há nada de extraordinário no facto de uma cidade, uma só cidade, dispensar ao país ambos os representantes das duas classes profissionais mais influentes de Portugal. Desde logo porque não é crível que a cidade em causa tenha, enquanto tal, grande responsabilidade nisso. Mas também porque a representação dos respectivos bairros é, seguramente, uma tarefa, se não ausente, pelo menos marginal no dia-a-dia dos dois bastonários, António Marinho e Pinto e José Manuel Silva. A verdade, porém, é que ambos chegam de Coimbra e representam hoje, respectivamente, os advogados e os médicos portugueses.

Assim sendo, para além da minha vaidade – talvez misturada com um certo provincianismo – poucas razões concorrem para que se assinale o que parece ser pouco mais do que uma feliz casualidade. Com efeito, não foi um suposto lóbi de Coimbra que colocou os bastonários nos respectivos lugares; a promoção da cidade não preenche, decerto, a agenda de qualquer um deles; e, verdade seja dita, são timidas (ou nulas) as manifestações coimbrãs, a este propósito.

Está, pois, tudo muito certo. Nada de especial a assinalar. E esta crónica, para não destoar, deveria acabar por aqui. Mas há qualquer coisa de muito errado numa cidade que lamenta a sua perda de influência quando, ao mesmo tempo, “cede” ao país dois bastonários e, já agora, um Presidente do Tribunal Constitucional. Apetece perguntar se Coimbra não tem influência ou se, pelo contrário, não sabe (ou não quer) usar a influência que tem.

É que, independentemente de qualquer cidadão de mediano entendimento perceber que as duas ordens profissionais em presença não se transformaram em embaixadas coimbrãs, pela naturalidade ou proximidade dos respectivos titulares; independentemente de parecer óbvio que, menos ainda, o Palácio Ratton seja uma sucursal da Universidade de Coimbra, isso não é razão para que a cidade não procure em cada um deles a provedoria necessária, em momentos decisivos.

Se não o faz porque ainda não tinha pensado nisso, tem agora bom remédio. Se não o faz porque, simplesmente, não o quer fazer, então, acho que não tem remédio nenhum.