27.7.10

Um falso obituário



Uma reportagem recente do suplemento Ípsilon, no jornal Público, abre com a frase “Coimbra não sabe para onde vai – e por isso não vai a lado nenhum”. Não traz nada de novo, o escrito. Seja pela narrativa; seja pelo estilo; seja apenas pelo teor. Numa pretensa pele de visitante, alguém escreve sobre a cultura coimbrã, apressadamente, para chegar, por fim, ao princípio. De facto, se o texto abre com a tirada do “não vai a lado nenhum”, fecha com um afirmativo “ponto final”. Uma sentença, grave, solene, de morte.

São poucos os verdadeiramente livres naquilo que pensam, escrevem e dizem. A maior parte de nós parte da conclusão para construir um arrazoado que a legitime. É isso, afinal, que eu próprio faço, habitualmente. É o que faz a maior parte dos mortais. E é o que fez a responsável pela reportagem do Público.

Nada de estranhar. Não tivéssemos nós um punhado de certezas para esgrimir nesta vida e a incerteza remeter-nos-ia sempre para a lucidez da loucura. Mas adiante.

Pretende, pois, a reportagem, o que se pretende de costume: que Coimbra parou no tempo e que a ampulheta, simplesmente, se partiu. Daí em diante, tudo o que se faz é uma espécie de ficção local, como que um epitáfio, já fora da história. Coimbra acaba por ser retratada como um doente terminal e ao que de bom se vai fazendo – também na cultura – dá-se glórias de paliativo.

Reacções – muitas – nas redes sociais e blogues da cidade, há-as para todos os gostos. De um lado, a incontida revolta, perante o que se considera uma peça jornalística preconceituosa, ansiosa por provar que em Coimbra não se passa nada; do outro, os que lhe encontram ainda um sentido pedagógico, um convite à contrição que não fará mal nenhum, quer aos agentes culturais, quer aos poderes públicos. Num certo sentido, uns e outros, terão razão. Mas interessa pouco que continuem a falar, uns para os outros.

Se a reportagem do Público faz lembrar um daqueles falsos obituários, a antevisão da morte tem quase sempre o condão de nos fazer sonhar com o que falta fazer. Ponto final? Não, reticências.

13.7.10

Começo de conversa


Em Outubro próximo, teremos eleições para a Federação de Coimbra do Partido Socialista. Victor Baptista candidata-se a um quarto mandato, fazendo-o, mais uma vez, pela “última vez”. E enfrenta a recandidatura de Mário Ruivo, este agora na expectativa de converter em vitória o resultado de há dois anos, que se cifrava já em quarenta por cento dos votos expressos. Estarei ao seu lado, como há dois anos e esta é, para todos os efeitos, a minha declaração de interesses. Formal e definitiva.

Se há coisa que me incomoda na política são aquelas pessoas que “não fecham portas”, na ilusão de que, por essa via, as abrem a todas; os que ficam nas meias palavras, ou nas meias tintas, à espera para ver no que dá. Piores mesmo, só os que são capazes de defender tudo e o seu contrário, dependendo das estações do ano, conforme (o que lhes) calha. Os tempos, na política em geral, no PS em particular e em Coimbra, muito especialmente, reclamam clareza, convicção, seriedade e coerência. Tudo o mais concorre apenas para o pântano de que desgraçadamente tentamos escapar, vai para uns anos valentes.

Nada que impeça, porém, a cortesia, a simples educação, no decurso da campanha. E nada que iniba o debate de ideias, de boas ideias, suficientemente explícito para sugerir aos militantes caminhos distintos, que valham o sufrágio. Até porque, aliás, uma coisa não vive sem a outra.

A banalidade programática mascara-se, habitualmente, pela vulgaridade das campanhas. E a “madeirização” da política não deixa espaço, até mediático, para grandes debates.

Depois das eleições de Outubro, era bom que a Federação do PS Coimbra passasse a ser vista como um espaço de urbanidade política, onde a divergência fosse uma fonte de coesão, ao invés de ser factor de um belicoso conflito; era bom que se lançassem as bases de uma nova praxis partidária, assente no mérito, na competência e na defesa do interesse comum; era bom, para não dizer óptimo, que o PS Coimbra passasse a ser contribuinte líquido de um Distrito que se afirme pelos bons exemplos. Esse será, já, um bom começo de conversa.

9.7.10

Regresso ao futuro?

O Marty McFly chegou ao "futuro" com o Delorean, faz hoje 3 dias...



6.7.10

Um eixo


Há pessoas que, não nos sendo íntimas, se cruzaram connosco, desde sempre. E, nessa medida, acabam quase por sê-lo. O Maestro Virgílio Caseiro é, para mim, uma dessas pessoas.

A primeira memória que tenho dele está ligada ao facto de ter sido professor de música de um dos meus melhores amigos, éramos alunos do Colégio S. José, na Conchada, mesmo à beira da que – julgo – seria a casa do Maestro (não o sendo já, isso é certo, e explicarei adiante porquê). Estávamos em meados da década de 80 e o meu amigo, hoje doutorado nas medicinas, deu ali os primeiros passos rumo ao velhinho conservatório, ainda na alta coimbrã.

Lembro-me, depois, de o Maestro Virgílio ser tema recorrente nas conversas de outros amigos, seus alunos no curso de Educação Musical da Escola Superior de Educação de Coimbra. Sempre como uma personalidade singular, admirada, incontornável músico e pedagogo.

Mais tarde, por circunstâncias várias, passámo-nos a encontrar “sob a batuta” da dra. Emília Martins, a incansável directora da Orquestra Cássica do Centro. Sucedendo também, de há tempos a esta parte, sermos vizinhos, o que que explica a certeza de que, pelo menos actualmente, o Maestro não reside na Conchada.

Ora, escrevo este texto no dia da Cidade de Coimbra, breves horas antes da homenagem que o Município lhe prestará. E ocorre-me dizer que este conjunto de episódios, dizendo pouco sobre mim, dizem tudo sobre o Maestro.

Eu sou um dos muitos que, em Coimbra, viram as suas vidas cruzadas, directa ou indirectamente, pela presença do Maestro. Ele é, verdadeiramente, um eixo na vida da cidade e na própria biografia dos conimbricenses. À míngua de referências, isso, só por si, justificaria o tributo.