Num texto recente, sugeri a eleição à esquerda de um presidente para a Assembleia Municipal de Coimbra. Se a lei permite e os cidadãos confiam, não devem as cúpulas partidárias excluir a possibilidade de assembleias e executivos municipais de sinal diferente. Essa seria uma oportunidade para inaugurar a convergência das esquerdas, em Coimbra, por esdrúxula que a ideia se possa afigurar. Mas não me estenderei no argumentário, senão para dizer que outra concepção defrauda quem, nas urnas, botou a cruz em quadradinhos diferentes, para a Câmara e para Assembleia. Anulando, nesses casos, pelo menos um dos votos.
Mas isso agora interessa pouco e o facto é que até me alegrei, semana fora, ao ler na imprensa que o que antes parecia ser uma posição de princípio contra a eleição de Helena Freitas dava, aparentemente, lugar à determinação contrária. Alegrei-me, não que me convencesse da persuasão dos meus argumentos, sequer da sua idoneidade moral, mas porque, no fim de contas, por razões eventualmente transcendentes, teríamos uma presidente de Assembleia Municipal eleita pela esquerda.
Observo agora, conhecida a reeleição de Manuel Porto, que a esquerda foi tímida nos esforços que desenvolveu. E que, com efeito, não é de esquerda o presidente da Assembleia Municipal de Coimbra. Mas é de esquerda, continua a ser de esquerda, a Assembleia, ela própria, facto a que, já agora, não deixarei de pedir consequência. Resolvida a eleição dos cidadãos a ou b para a mesa da assembleia, chegou a hora de tratar da política, propriamente dita.
É que a política, a dita cuja, anda demasiado sequestrada pelos seus protagonistas, pelas opções de vaidade, antes de se iluminar pelas ideias que transporta, pela nobreza dos propósitos e pelos resultados da acção. O que, se pensarmos bem, nem sequer é uma tendência recente: o culto da personalidade perpassa toda a história e ciência políticas. Apenas que cada um trate de assumir, claramente, uma posição sobre o assunto. A minha inclina-se para a urgência de uma esquerda que assuma, sem ambiguidade, as suas ideias políticas. E que deixe de lado o perfil ou a estatura dos protagonistas, pelo menos na acepção que a Ana Salazar privilegiaria.
Coimbra precisa de uma esquerda una, que promova um desenvolvimento urbano sustentável; que perceba que a segurança não se resolve pelo casse-tête, antes depende da integração económica e social das comunidades; que assuma a participação dos cidadãos como condição de vitalidade democrática; que eleve as consciências através da cultura, ao invés de as apascentar; e que não se limite a assobiar para o lado do Governo, quando chamada a pronunciar-se sobre o desemprego ou o definhamento industrial.
Até desejo felicidades ao professor Manuel Porto. Mas, claro, se elas não dependerem de uma esquerda resignada, apática ou disforme.