25.10.10

Bons costumes


Cumpriu-se no último Sábado o congresso distrital do PS Coimbra. Dele se retiram duas notícias essenciais. A primeira, a de que os dois candidatos chegaram a acordo quanto à composição da próxima Comissão Política Distrital, apresentando uma lista de consenso, liderada pelo presidente eleito e ali empossado, Mário Ruivo. A outra, a de que o presidente cessante, derrotado nas eleições, mantém a impugnação judicial do sufrágio, não se conformando com o resultado, apesar daquele acordo. Confusos? Não é razão para menos.

O horizonte de um acordo entre as duas listas concorrentes começou a traçar-se, publicamente, no decurso da última semana. E a possibilidade da sua concretização ganhou um novo fôlego ao início da manhã de Sábado quando, em pleno congresso, Mário Ruivo desafiou Victor Baptista nesse sentido. As horas seguintes vieram confirmar o acordo. Mas não sem um particularismo bizarro, daqueles a que o deputado Victor Baptista já nos habituou: integra a lista de Mário Ruivo, mas não lhe reconhece a liderança; aceita ser presidente da mesa da Comissão Política Distrital, mas acha que a sua eleição é ilegal. Um pouco como a rábula do aborto e a caricatura de Ricardo Araújo Pereira ao professor Marcelo: “é proibido! Mas pode-se fazer! Mas é proibido! Se fizer o que é que me acontece? Nada! “. E assim por diante…

Ora, dita a experiência que mais vale um bom acordo do que uma má demanda. Mas impõem os bons costumes que, feito o acordo, termine a demanda. Dito de outra forma: se eu dever dinheiro a alguém e contra mim for instaurada uma acção judicial, qualquer acordo sobre o pagamento da quantia em causa, determina a desistência da referida acção. Isto é o tipo de coisa que qualquer pessoa de bons costumes – e de boa fé – percebe. Mas não é essa a opinião do deputado Victor Baptista. Para ele, é uma questão de princípio fazer um acordo com a mão direita e impugnar as eleições com a mão esquerda. Como é uma questão de princípio participar num Congresso e entregar um protesto a contestar-lhe a legitimidade, tudo de uma assentada. Eu acho que isto não é princípio nenhum. E acho mesmo que é o fim.

Fica-nos o exemplo – e a paciência – de Mário Ruivo, que para além de se ter disposto a um acordo, apelou à consciência do presidente cessante, para que pusesse a impugnação de lado. Victor Baptista, acha, todavia, que o congresso é proibido. Mas pode-se fazer! Mas é proibido...

18.10.10

Bons ventos


Porque de Coimbra também sopram bons ventos, é dia de felicitar a Escola Secundária D. Maria. Pela nem sei que vez consecutiva, sagrou-se primeira no ranking nacional de Escolas Públicas o que, na prática, significa que os seus alunos obtiveram a melhor média nos exames de acesso ao ensino superior. Ainda que daqui a uns anos uma parte deles se arrisque a não saber onde meter o canudo, por agora, estão de parabéns eles, está de parabéns a escola e, já agora, que me perdoem o bairrismo, está de parabéns Coimbra.

Mas não são os únicos. Gostei particularmente de ouvir a dra. Maria do Rosário Gama (declaração de interesses: tenho o prazer de a conhecer) dizer o que, de resto, tem dito mais vezes. Sente-se honrada pelos resultados mas ressalva: “A escola está inserida numa zona urbana de meio económico médio alto e os alunos têm apoios extracurriculares como é o caso de explicações, tal como acontece na maioria das escolas dos grandes centros, uma realidade que é bem diversa noutras zonas do país.” A isto acresce, segundo a Directora, o esforço e o acompanhamento dos professores da escola, a quem acaba por endossar a maior parte dos méritos. Porque gostei de a ouvir? Porque a sua postura não é comum.

Todos os dias ouvimos nas televisões ou nos jornais quem fuja às responsabilidades e seja incapaz de assumir, com grandeza, os seus fracassos. Quem, por outro lado, contemple o sucesso do alto grandiloquente da sua singular existência. São raros, cada vez mais, o que se sabem colocar no seu lugar.

Recordo-me, a propósito, de uma história antiga, que ouvi contar recentemente a um amigo, também de Coimbra. Uma formiga e um elefante correm pelo deserto (ela a “cavalo” nele, claro) e a dada altura a formiga olha para trás e exclama: olha a poeira que nós levantámos! Ora, a reacção da dra. Rosário Gama ao prémio da “sua” escola diz bem que, mesmo em sentido figurado, ela se parece muito pouco com uma formiga. Sendo que o assunto, por se passar em Coimbra, merece uma segunda nota.

O exemplo que nos chega do D. Maria é não só de uma geração de gente qualificada – ao nível do melhor que há no país – mas também, quero crer, de pessoas que sabem respeitar os outros e que, em especial, se sabem dar ao respeito. Quem ainda não desistou de Coimbra sabe o quanto precisamos disso.

12.10.10

Honra aos vencidos

Eu já perdi eleições. Mais do que uma vez, até. E não gostei nada que tivesse acontecido. Graças a isso, porém, aprendi duas coisas: que os astros não se conjugaram especialmente, predestinando-me às vitórias, no dia em que cheguei ao mundo; e que aprender a perder com dignidade seria, para os desafortundados como eu, um elementar manual de sobrevivência. Posso dizer que não me tenho saído mal.

Descobri cedo, embora com marcado pesar, que sou um cidadão mediano, com desgraçada tendência para a mortalidade. E confesso que isso tem sido da maior serventia: deixei de conduzir em excesso de velocidade, durmo oito horas por dia, tento não apanhar sol na moleirinha e evito, por via das dúvidas, andar de montanha russa. Não que isso me realize especialmente (talvez até faça de mim um chato!), mas como não posso apelar às constelações para me manter inteiro, conforto-me ao menos com estes rituais e vou-me sentindo feliz, pela mera circunstância de andar por cá.

Por outro lado, descobri que perder com dignidade tem pouco a ver com o apelo às vitórias morais. Quando se perde, perde-se mesmo, e não se aprende a perder ficcionando-se uma vitória, ainda que moral. “Ah e tal, eu era o melhor, os outros é que não perceberam!”.. Até mesmo porque nenhuma eleição serve para decidir quem é o
melhor. Mas isso é outra história.

A verdade é esta: perde-se quando houve menos pessoas a votar em nós do que no adversário, ponto final. E a partir daí, o melhor é meter a viola no saco. A dignidade(externa) advém daí e um outro tipo de dignidade (a interior) vem mesmo antes disso. Vem, digamos, nos preliminares: quando se concorre porque se acredita, com bondade, no que se está a propor, é suportável, apesar de tudo – e digno – perder. Caso contrário(e esse é o tipo de derrota que nunca tive), caso se concorra apenas “para ganhar”, o que é muito usual, admito que perder seja mesmo desagradável ou, digamos, anti-climático. É talvez, também, se quiserem, uma questão de romantismo.

Ora, no passado Domingo, o candidato Mário Ruivo saiu vencedor de umas eleições internas, tornando-se Presidente da Federação Distrital do PS de Coimbra. Por seu turno, o candidato Victor Baptista saiu derrotado das mesmas eleições, abandonando o lugar que ocupava há quase uma década. Ademais, cumpre dizer que nenhum dos dois é um ser sobrenatural predestinado aos holofotes da glória e que a ambos seria exigível que, se perdessem, se comportassem com dignidade. Um deles, eu sei que tem essa consciência. Aliás, há coisas que aprendemos juntos. O outro, bem, o outro, nem por isso.

6.10.10

Horizontes


Cumprem-se os últimos dias de campanha na federação distrital do PS Coimbra. Por esta altura, vale a pena lamentar algumas perdas de estribeiras, mas sublinhe-se, em especial, a normalidade dos meses que passaram. Para tal terá contribuído, é certo que em doses diferentes, a urbanidade de alguns, mas também a simples, prosaica mesmo, cautela de outros. Diferentemente do que sucedeu há dois anos, e usando uma metáfora recente, são já poucos os que arriscam praguejar contra uma ventoinha.

Talvez por isso, é possível observar que, hoje, as manifestações dos militantes se dividem, cada vez mais, entre dois registos: um afirmativo e um outro - vagamente contrariado. Num certo sentido, às manifestações de apoio a Mário Ruivo, contrapõem-se agora os, digamos, apenas subscritores da candidatura de Baptista. E alguns destes, “ilustres” sobretudo, adoptam aos poucos um discurso auto-justificativo, como que sugerindo, entre dentes, a inevitabilidade, quase metafísica, da posição que tomaram. Ele é a “crise”, ele é a “lealdade”, ele é uma muito própria concepção de “solidariedade”, que já me entristeceu e que agora apenas me diverte. No meio disto tudo, está bom de ver o que está, afinal, à vista de todos: cheira a fim de regime, para os lados da Oliveira Matos.

Estou absolutamente convencido da eleição de Mário Ruivo, no próximo dia 9 de Outubro. E já nem me perderei a enunciar as razões do meu apoio, todas amplamente expendidas, no decurso dos últimos dois anos. Diferentemente, apetece-me pensar no próximo dia 10 de Outubro, primeiro dia do seu primeiro mandato, como presidente da federação do Partido Socialista de Coimbra. Precisasse ele do meu conselho – que não precisa! – dir-lhe-ia apenas que esse será o dia em que os militantes do PS reconhecerão a probidade do seu percurso, a firmeza do seu carácter e o mérito das suas ideias. Mas que, daí em diante, será posto à prova, como nunca no passado.

Há um partido para organizar e colocar ao serviço das secções e dos militantes, com transparência. Há um programa político para afirmar, na vanguarda das Políticas Locais, mas também na defesa do Estado Democrático e Social em Portugal. Há para erigir, quase dos escombros, uma nova relação de confiança com os eleitores do Distrito. E, como se não bastasse, há para resgatar a própria imagem de Coimbra, que alguns reduziram à dimensão paroquial que é, diga-se afinal, a dimensão dos seus próprios, e estreitos, horizontes.