O protesto da geração à rasca deu pano para mangas, na última semana. A seu pretexto - e da cantiga dos Deolinda e das atoardas do Jel - há quem tenha disparado os mais esforçados exercícios psicanalíticos sobre a sociedade portuguesa. Cada um -entre comentadores, jornalistas e mesmo manifestantes - tem uma teoria exclusiva. Seja sobre as motivações, seja sobre as repercussões da manifestação que, no último sábado, mais milhar menos milhar, encheu de gente avenidas largas, por esse país afora. A mais reincidente será, talvez, a que - embora com uns remoques auto-justificativos pelo meio - se empenha em colocar a nú a ingratidão dos jovens portugueses.
Uma geração que não sofreu a guerra, nem a fome, nem a ditadura - que as não sofreu, supõe-se, por acto magnânime da geração que nos governa (não me refiro apenas aos políticos!) - não tem do que se queixar. E eu entendo o que querem dizer: os que foram poupados às páginas mais negras da história portuguesa devem agradecer, reverentemente, os quinhentos euros que agora lhes aconchegam o bolso. Ou, dito de outra forma, seria injusto que, para além de terem escapado ao Ultramar, pretendessem, ainda por cima, arranjar um emprego. Só posso dizer que é uma forma tão boa como qualquer outra (ou seja, má) de enfiar a cabeça na areia.
Em Coimbra, na Praça da República, também se protestou. Parece, no entanto, que o número de manifestantes ficou aquém, bastante aquém, das expectativas. Do lado de quem governa a cidade haverá, talvez, a tentação de achar ser esse um sintoma de como em Coimbra se vive bem, a coberto dos males da pátria e de como, na cidade dos estudantes, verdadeiramente, não existe uma geração à rasca. Essa seria uma boa notícia, mas uma notícia errada. Todos os dados apontam a circunstância de Coimbra se estar a tornar numa das cidades mais envelhecidas do país e onde é mais difícil arranjar emprego. Ora, então, como justificar o aparente fracasso da manifestação?
Eu - já agora - também tenho uma teoria.
Salvo melhor opinião, creio que o problema de Coimbra é mais grave do que o de Lisboa ou mesmo do Porto. Nas manifestações de Lisboa e do Porto estiveram centenas, talvez milhares de jovens conimbricenses, à procura da oportunidade que, em Coimbra, se cansaram de procurar. Nasceram em Coimbra, mas hoje vivem, ou sobrevivem, em Lisboa ou no Porto. Nesse sentido, o futuro de Coimbra, a transformação necessária, poderão esbarrar num obstáculo a considerar, seriamente: o êxodo de uma geração inteira que, simplesmente, está a deixar de acreditar. E esse poderá bem ser ser o retrato mais acabado de uma cidade à rasca.