Nos últimos dias foi conhecida a expulsão de vários militantes do partido socialista, creio que duzentos no total, sendo vinte deles no distrito de Coimbra. A sanção, prevista nos estatutos e aplicada pela jurisdição distrital dos socialistas, explica-se com a participação daqueles militantes em listas opositoras às apoiadas pelo PS, no âmbito das últimas eleições autárquicas. Nada a obstar, no plano jurídico. A sanção é, aliás, necessária. Mas fica muito por dizer, quase tudo, no que à política diz respeito.
A militância num partido político não se confunde com uma profissão de fé ou com a preferência por um clube de futebol. Estas, sendo diversas entre si, convergem nos valores sobretudo afectivos ou espírituais em que radicam, não reclamando, por isso mesmo, uma particular racionalidade e, sobretudo, não conferindo aos seus “associados” um verdadeiro estatuto. Muitos de nós nascem, aliás, com religião e clube de futebol já definidos. O mesmo não se passando – espera-se – com a militância partidária.
Quando se adere a um partido, adere-se voluntariamente a uma declaração de princípios e a um certo legado histórico, na expectativa do seu aprofundamento. E adquire-se um estatuto, que confere o direito e o dever de contribuir, activamente, com sentido crítico, para esse aprofundamento. Sendo essa solenidade que torna tão estranho o impulso de quem, num determinado momento, é militante de um partido e, no outro, resolve bater-se, nas urnas, contra esse exacto partido. Ou pelo contrário.
Seria estranho se os partidos, em regra, fossem espaços de discussão política, generosa e qualificada, ao invés de serem os simulacros de debate que, muitas vezes, o próprio parlamento evidencia; seria estranho se a regra fosse comportarem-se os partidos e, em especial, os seus dirigentes, como fiéis depositários de algum princípio, que não o da sua particular existência; seria estranho se, por exemplo, em Coimbra, ser socialista de cartão passado comprometesse, em regra, com a efectiva prossecução do socialismo - se há até quem se dedique a converter social-democratas para a conquista de municípios pelo PS!
A regra, demasiadas vezes, é não haver regra. E por isso, a alguns, de vez em quando, aplica-se a regra.