21.9.10

A ajuda do público


O presidente da República prepara-se para promulgar um diploma que atribuirá às autarquias competência para determinar o encerramento, ou não, das chamadas “grandes superfícies”, nas tardes de domingo e nos feriados. Depois de avanços e recuos vários, lá se entendeu que as câmaras municipais, pela sua proximidade às comunidades, pelo seu conhecimento “do terreno”, estariam em melhores condições para avaliar se, sim ou não, devem as “grandes superfícies” competir, sem quaisquer restrições, com o comércio dito tradicional.

Confesso que, quando ouvi a notícia, me lembrei de Coimbra e antecipei a felicidade do dr. Encarnação por, finalmente, tomar nas mãos o destino da cidade. Logo ele, que tanto lamenta a interferência do poder central, teria aqui uma oportunidade de ouro para concretizar parte dos seus planos, tão injusta e frequentemente interrompidos pela existência malévola de um Governo democraticamente eleito. E comovi-me, pois, com esse horizonte: enfim sós, Coimbra, o dr. Encarnação e um céu estrelado.

É por isso que as últimas notícias sobre o assunto me deixam triste e defraudado. Pelos vistos, não está nos planos da câmara de Coimbra tomar posição sobre a concorrência entre as grandes superfícies e o comércio tradicional. Diz-nos o seu vice-presidente que prefere, em alternativa, referendar o assunto. Ou seja, no seu subido entendimento, são os consumidores que devem decidir o que querem, em ambiente de total “liberdade”. Melhor dito, para a câmara de Coimbra, a melhor forma de regular o mercado é, nem mais, nem menos, perguntar-lhe para onde vai.

Os que continuam a achar que o poder local não se compadece com devaneios ideológicos, encontram neste episódio muito sobre o que falta discutir, a propósito, especialmente em Coimbra.

A crédito do referendo, apaixonadas considerações sobre a democracia participativa e a modernidade na governação local. Ao longe, muito ao longe, arrebatadas posições sobre a imensa sabedoria popular. Extraordinário esforço para iludir a óbvia conclusão que se retira deste assunto: incapaz de responder com acerto à pergunta que lhe é colocada, a câmara de Coimbra prepara-se para pedir, afinal, a ajuda do público.