13.9.10

Tanto tempo



Entrei no Conservatório aos 14 anos, por iniciativa própria. Não entrei cedo e, talvez por isso, não me aguentei por lá, muito além dos 18. Entre o final da adolescência e a entrada na faculdade, a disciplina que o Conservatório impunha estava longe de ocupar as prioridades de um jovem mediano. Isso e uma duvidosa vocação para o bel canto acabaram, à época, por me afastar da Sé Velha – pelo menos durante o dia! - lá onde funcionava o, também velhinho, conservatório de Coimbra. Pode dizer-se que o Conservatório perdeu um sofrível tenor, para ganhar um admirador militante.

Acho que nunca me esqueci das primeiras aulas, dentro de um cubículo que antes tinha sido uma casa de banho. Mas, sobretudo, não me esqueço de como – mesmo naquelas condições – professores, funcionários e alunos desempenhavam, com enorme dignidade, a sua missão. Fizeram-no de tal forma que os governos e executivos municipais sucessivos se permitiram, simplesmente, ignorar a urgência de uma nova casa para o Conservatório. De facto, a qualidade do trabalho pedagógico e artístico desenvolvido, sempre soube iludir as suas limitações de base. E, sobretudo, fez com que poucos se lembrassem de perguntar como seria se em condições, ao menos, razoáveis.

Demorou tempo, demasiado tempo, o novo Conservatório. Da Sé Velha, primeiro, para uma solução mais ou menos itinerante, depois, passaram talvez vinte anos até que se resolvesse o problema, agora, com as novas instalações integradas na Quinta das Flores. E se quisermos ser sérios, vale a pena assumir que nem há um só culpado pelo atraso, nem há um principal responsável pela inauguração.

A política habitual depressa se encarregará de abençoar o Governo, por um lado, a Autarquia pelo outro - e os respectivos partidos -, que juntos cortarão a fita, proferindo eloquentes discursos sobre a vanguarda e o progresso. Eu prefiro dizer que ambos se limitarão a cortar a meta de mãos dadas, com, pelo menos, duas décadas de atraso. Permitam-me que o diga: de parabéns, só mesmo o Conservatório. Por se aguentar de pé, sem sair do tempo, durante tanto tempo.

Hoje, no Jornal de Notícias.