29.6.09

Um asterisco



Fazendo uso de uma justa precedência protocolar, o dr. Encarnação tomou a palavra na abertura da CIC’2009 para dizer o costume: que Coimbra é uma aldeia gaulesa, gloriosa resistente às malfeitorias do império romano-lisboeta. Nada de novo, portanto. O dr. Encarnação mantém-se confortável na pele de um Asterix e os conimbricenses terão que se resignar a essa infeliz caricatura. Em Coimbra, a palavra de ordem é, como no filme, formation Tortue!, que em português significa "formação tartaruga" e nos impõe uma espécie de posição fetal, enquanto, com a carapaça, protegemos a moleirinha.

Claro que, em Coimbra, proteger a moleirinha é particularmente importante. Como se sabe, é a moleirinha que alberga o conhecimento e, sendo Coimbra a capital do dito, está em causa uma verdadeira razão de Estado, a jóia da coroa, uma pérola desta nossa existência singular. Mas, enquanto isso, há quem avance para o campo de batalha, vença os inimigos ao invés de os lamentar, sem recurso a fantasiosas poções mágicas.

Este enredo, que podia ser cómico, não tem piada nenhuma. E Coimbra é hoje uma cidade com medo de existir, fechada sobre si própria, que acabará por morrer, esgotada e faminta.

Mas creio, na verdade, que a cidade precisa de acreditar na vida depois da morte. O que, ao contrário do que possam pensar, não será uma reencarnação, mas um renascimento. Um tempo de renovação das ideias, que abandone mitos esgotados e que exalte o humanismo, a razão e o progresso

É que, lá longe, na capital do império, Coimbra vai sendo vista, apenas, com bonomia e indulgência. E a vizinhança, como Aveiro, Leiria ou Viseu - todas cidades governadas por gente do PSD - já nem disfarça o sorriso. Agradece o despique gaulês e vai colhendo como pode, como se vê, do despautério coimbrão.

Compreendo a militância do dr. Encarnação contra Lisboa. Mas, que me perdoe, é pena que a história de Coimbra esteja há tanto tempo subjugada a um asterisco.